Desenhando na Areia

Quando criança, aprendi que desenhar nas paredes de casa poderia ter como consequência, levar algumas palmadas.
Depois aprendi que espalhando tinta no chão, eu poderia ganhar uma pequena surra. Desenhar na porta do armário tinha seu encanto, mas também sobrava tapaiada pra todo lado. Que eu me lembre, podia até usar um papel, mas sentia que faltava algo, pois sempre era de um tamanho limitado e não tão desafiador assim.

Então descobri um local muito legal pra desenhar. Um lugar gigante, que aceitava qualquer maluquice que eu fizesse. Não podia usar tinta, dava até pra digerir isso porque outra limitação não rolava. Quando eu desenhava, se formavam umas sombras e uns relevos diferentes e únicos, e ainda podia ser do tamanho que eu quisesse.

Por que será que depois que crescemos, depois que viramos essa adultez toda, temos tanto receio de “fazer um traço” solto, descontraído, sem determinações?
Não falo nem em desenhar, senão o monstro da culpa acorda.
E a aí começaria o embate. Ter que desenhar “alguma coisa”. Que seja reconhecida, nomeável, palpável, que todos consigam reconhecer e identificar. Senão… num teria sentido! Pode não! Que coisa horrível!

E aí, onde fica a alegria de interferir nos espaços? Quem vai definir as regras do que pode ou não pode? O que é mais importante, o resultado final ou a simples satisfação de realizar?

A areia da praia é nossa parceira. Vai aceitar o que inventarmos, o que imaginarmos, o que der vontade de rabiscar. E pode ser com qualquer coisa que se use, que esteja à mão. Pode ser dedo, graveto, pedra, concha… Ela não liga para “técnicas” ou movimentos artísticos consagrados.

Um traço é gesto e desejo, é um erro que pode virar estilo. Não é apenas o riscar de que se trata, mas o abrir janelas no tempo e no coração… E aí pouco importa se está certo ou pareça real, o importante é brincar de criar com o material que o universo nos está dando.

Tudo é belo, tudo é correto, tudo é possível…

Depois o vento, a chuva e o mar fazem seus deveres de casa para absorver o que fizemos e entregam tudo limpo e intocado, para que o próximo “artista” que vier possa também aproveitar de um local e momento únicos.

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