

Uma manhã de um dia de verão, pleno janeiro, praia lotada prá variar. Famílias em desespero, crianças correndo, picolés derretendo, adultos se hidratando com cervejas e o espaço da areia literalmente ocupado por milhares de barracas. Monte de gente, e cada um aproveitando a praia a sua maneira.
Nisso eu vejo uma figura se destacando de todo este contexto. Figura que parecia ter saído de um filme alternativo, desses que misturam nonsense com uma dose de ficção em quadrinhos. Vinha caminhando solitariamente pela beira do mar. Era um homem de meia idade, um desses com um sobrepeso avantajado, podemos considerar. Até porque isso fazia parte da cena insólita. Um homem de meia idade, barrigudo, com passos calmos e expressão de quem estava pouco se importando com a maneira “normal” que as pessoas aproveitavam a praia. Com um detalhe: Estava vestido de Super-Homem.
Sim, o Super-Homem em carne, osso e sobrepeso, usando uma roupa colante azul que marcava tudo, todas as dobras possíveis. A clássica cuequinha vermelha por cima, a capa vermelha ondulando ao vento, e o “S” no peito tão esticado e fora de esquadro quanto sua figura fora de contexto.
Ninguém dizia nada, mas todos olhavam com espanto. Até as crianças pareciam manter uma distância respeitosa.
Ele não falava, não interagia. Apenas caminhava cabisbaixo, desviando das pessoas, dos pequenos brincando e das meninas molhadas saindo do mar. Deu prá visualizar? Aquela barrigona proeminente andava de cabeça baixa, com um meio sorriso maroto e não olhava diretamente prá lugar nenhum, simplesmente andava na beira d’água, sem abordar ninguém, sem fixar ninguém, sem nem estar molhado da água do mar.
Era como se fizesse parte de outra dimensão. Um herói aposentado, talvez. Um figurante perdido de algum bloco de carnaval que começou mais cedo. Ou um agitador moderno anunciando, com sua figura inusitada, que ainda há espaço para o absurdo numa época tão ansiosa por coerência.
Na verdade parei tudo e fiquei observando.
Fui obrigado a criar alguma história viável para explicar a cena e acalmar minha razão. Eu dizia a ela pra ficar tranquila, porque deveria existir um motivo racional para ele estar se portando daquela maneira. Olhei bem em volta pra ver se alguém estava filmando… e nada! Pensei: talvez ele tenha perdido uma aposta com sua turma, talvez seja sua forma de lidar com uma perda recente ou tenha feito algum tipo de promessa. Ou talvez seja só um cara que resolveu, por um dia, gozar da cara de todo mundo. Porque vamos combinar: é preciso ter coragem para ser ridículo em público. Coragem ou loucura, tanto faz. Quem nunca desejou um pouco dos dois?
Naquele dia, o Super-Homem andou pelas areias da Praia do Forte, mas não salvou ninguém. Porém me fez sorrir por dentro e me fez pensar na doideira intangível que passa na cabeça de cada um. Talvez ele tenha me salvado um pouco da normalidade estabelecida, da obrigação de sempre parecermos razoáveis e equilibrados. Depois que ele se misturou e desapareceu na multidão, fiquei com a certeza de que estar na praia num dia de sol lotado, é possível fazer parte de uma inusitada comédia pastelão.
O cara me fez rir muito, aliás de todos nós, de verdade!